Você já se perguntou por que há tanta resistência em conceder créditos pela sua fotografia? Por que clientes, empresas e até colegas de trabalho hesitam em reconhecer a autoria de uma obra da qual se beneficiam ao publicar em suas redes sociais, sites ou de forma impressa, mas na hora de dar o tão necessário crédito ao autor (ou seria mais apropriado dizer criador?), acabam se recusando ou até “esquecendo”?
Os motivos variam, desde o receio de ter que pagar por uso comercial até o desejo de não compartilhar a atenção e as vantagens – sejam elas financeiras ou morais – com quem realmente concebeu a obra.
A Lei nº 9.610, de 1998, é a regra principal que protege os direitos autorais no Brasil. Ela garante que os autores tenham o controle sobre suas criações, como livros, músicas e obras de arte. Essa lei dá aos autores o direito de decidir como suas obras serão usadas e de ganhar dinheiro com elas.
Além disso, ela protege o nome do autor e impede que a obra seja alterada de forma que prejudique sua reputação. Com isso, a Lei 9.610 ajuda a valorizar o trabalho dos autores e a incentivar a criação cultural, ao mesmo tempo em que permite alguns usos educacionais e sem fins lucrativos.
Muitos profissionais sentem esse movimento como se fosse um roubo ou furto.
Felipe Ferreira: Fotógrafo e Advogado
Dito isso, conversamos com o advogado e fotógrafo catarinense Felipe Ferreira para trazer ainda mai luz a esse tema que se tornou (ou sempre foi) uma prática no país.
1 – Quais são os direitos que um fotógrafo possui sobre suas imagens, de acordo com a Lei nº 9.610? Ele sempre precisa autorizar o uso de suas fotos por terceiros?
Ferreira: O fotógrafo tem, sim, direitos sobre suas obras, que basicamente se dividem em dois tipos: morais e patrimoniais. Os direitos morais são inalienáveis (ou seja, não podem ser renunciados) e incluem o reconhecimento da autoria da obra e a preservação de sua integridade. Já os direitos patrimoniais referem-se à exploração econômica da imagem, o que exige autorização expressa do fotógrafo (salvo em casos específicos previstos em lei, como, por exemplo, para fins jornalísticos). Portanto, sim, o fotógrafo sempre precisa autorizar a utilização de suas obras, exceto quando há uma previsão legal que permita o uso sem essa autorização.
2 – Como funciona a cessão dos direitos autorais no caso de fotografias? O fotógrafo pode limitar o uso da imagem cedida, por exemplo, permitindo apenas o uso para fins específicos?
Felipe Ferreira: Sim, o fotógrafo pode limitar o uso de suas obras, por isso dizemos que a cessão de uso pode ser parcial ou total, conforme estabelecido em contrato. O fotógrafo pode definir restrições, limitando o uso e a finalidade da obra, como permitir o uso apenas em redes sociais ou determinar um prazo específico para a utilização das imagens. Na ausência de contrato, termo de cessão, licenciamento ou concessão, o fotógrafo mantém os direitos exclusivos de uso, distribuição e reprodução da obra.
3 – Quais são as implicações legais se alguém utilizar uma fotografia protegida sem autorização, especialmente em plataformas digitais? Como o fotógrafo pode agir para proteger seus direitos e buscar reparação?
Felipe Ferreira: Nesse caso, podemos afirmar que ocorre uma violação de direitos autorais, sujeita a sanções civis e até mesmo criminais. Na esfera civil, isso pode resultar em reparação de danos morais e materiais por meio de indenização, além da remoção da imagem utilizada sem o devido respeito aos direitos autorais. Na esfera criminal, pode configurar crime, com penas que variam de multa até detenção de 3 meses a 4 anos.
4- Muito profissionais acabam abdicando sobre esse direitos em nome do negócio, para não causar um desconforto/desgaste mesmo estando com a razão ao lado deles. O que você sugere a nível de argumentação para esse tipo de atitude? Há uma saída honrosa?
Felipe Ferreira: Abdicar desse direito pode desvalorizar o trabalho do profissional, mas é comum que fotógrafos enfrentem dilemas devido ao receio de problemas ou de prejudicar a relação com o cliente. Sempre sugiro aos meus clientes e mentorados que sejam diplomáticos, tenham bom senso e saibam “jogar com as situações”, explicando a importância de preservar os direitos autorais. Isso, inclusive, gera credibilidade e autoridade para o fotógrafo. Oferecer opções de licenciamento flexíveis em termos financeiros ou sugerir a inclusão do crédito autoral em locais alternativos — que não diretamente na foto — podem ser boas saídas para evitar desgastes e ainda assim vincular o nome do autor à obra. Por exemplo, em uma postagem no Instagram, o crédito autoral pode ser incluído na legenda, em vez de diretamente na imagem.
Apropriação do mérito
É intrigante observar como o ego humano pode influenciar a forma como lidamos com o mérito e o reconhecimento das criações alheias. Quando clientes, empresas e até mesmo colegas de trabalho resistem em dar os devidos créditos a uma fotografia que utilizam e da qual se beneficiam, estamos diante de um comportamento que vai além da simples omissão. Essa resistência revela um desejo profundo de apropriação do mérito, como se, ao não mencionar o autor, pudessem reivindicar para si parte da admiração ou prestígio que a obra suscita.
Os motivos para essa atitude são variados.
Alguns temem que, ao reconhecer o autor, estejam abrindo caminho para exigências financeiras ou legais, especialmente em usos comerciais. Outros não querem dividir a atenção ou os benefícios, sejam eles financeiros ou morais, que a obra proporciona. Há ainda aqueles que simplesmente subestimam a importância do crédito, encarando-o como algo dispensável.
Essa postura é contraditória e injusta.
A criação de uma obra, como uma fotografia, exige talento, tempo e dedicação. Negar o reconhecimento ao autor é desvalorizar todo esse esforço. Além disso, a Lei nº 9.610, de 1998, protege os direitos autorais no Brasil, garantindo aos criadores o controle sobre suas obras e o direito de serem reconhecidos por elas. Essa lei não apenas assegura a possibilidade de ganho financeiro, mas também protege o nome e a reputação do autor, impedindo que sua obra seja alterada de forma prejudicial.
EgoTrip
Ao refletirmos sobre esse comportamento, percebemos que ele é fruto de um ego que busca engrandecer-se às custas do trabalho alheio. É uma manifestação de vaidade e insegurança, onde o indivíduo prefere apagar o brilho do outro na esperança de que isso faça sua própria luz parecer mais forte.
Contudo, essa atitude não só é eticamente reprovável como também empobrece o ambiente cultural e profissional, desestimulando a criatividade e a colaboração.
Reconhecer e creditar o autor é um gesto simples, mas de profundo respeito e valorização. É reconhecer que cada obra é fruto da singularidade de seu criador e que o mérito deve ser devidamente atribuído. Somente assim poderemos construir uma cultura que prestigia a originalidade, incentiva a produção artística e respeita os direitos de todos os envolvidos.
Vamos mudar um padrão estruturado de conduta?
Não, definitivamente.
Mas a lei existe e está (pode acreditar) esperando por você caso precise dela.
O bem bolado existe, mas pense duas vezes antes de deixar alguém se beneficiar sozinho com sua criação.
Saiba negociar muito bem os únicos motivos pelos quais tudo isso acontece: o seu talento e seu legado.
Afinal, é pra isso que você divulga seu trabalho, para que saibam que é seu e consequentemente o contratem para continuar criando.
Vida longa à fotografia e ao direito autoral.
Crédito/Retrato: @leodiazfotos
Revista Latitude