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Fotografia Esportiva

Fotojornalismo Esportivo e a influência da TV

Se há algo que mexe com o coração dos brasileiros, é o futebol.

Mas, para além do espetáculo dentro das quatro linhas, existe um outro jogo sendo disputado: o da comunicação visual. A forma como consumimos o esporte mudou radicalmente nas últimas décadas, e um dos principais responsáveis por isso é a televisão.

Muito antes dos replays em alta definição e das câmeras super lentas capturarem cada detalhe de um lance, a fotografia era a grande narradora do esporte. Era através dela que os torcedores reviviam momentos históricos, como o salto impossível de um goleiro ou a comemoração épica de um artilheiro. Mas com a chegada da TV, e seu dinamismo inegável, o fotojornalismo esportivo precisou se reinventar para continuar relevante.

O estudo de Maria Fernanda Cordeiro e Paulo César Boni, publicado na revista Discursos Fotográficos (2005), mergulha justamente nessa transformação e analisa como o fotojornalismo esportivo passou a absorver características da transmissão televisiva. Um dos principais exemplos dessa influência é o jornal esportivo Lance!, que reformulou sua linguagem visual para competir com o impacto das imagens da TV.


Quando a Televisão Se Tornou o Novo Olhar do Esporte

A espetacularização do esporte não começou com a fotografia, mas sim com a televisão. Desde suas primeiras transmissões, a TV foi responsável por construir narrativas envolventes, transformando o futebol e outros esportes em produtos de entretenimento de massa. Através de closes dramáticos, replays instantâneos e ângulos cinematográficos, a experiência de assistir a um jogo foi elevada a outro patamar.

Diante desse novo cenário, os jornais impressos perceberam que precisavam mudar. Se antes bastava uma foto bem enquadrada e uma legenda descritiva, agora o público exigia muito mais. A televisão já entregava o movimento, a emoção e a plasticidade dos lances. Como então a fotografia esportiva poderia se manter relevante?

A resposta veio através de uma nova abordagem estética e editorial. O Lance!, maior diário esportivo do Brasil, entendeu essa necessidade e trouxe para o papel os elementos visuais que antes eram exclusivos da televisão.


A Nova Fotografia Esportiva: Um Espetáculo em Papel

O estudo de Cordeiro e Boni revela que o Lance! adotou uma série de estratégias para tornar sua fotografia mais impactante:

📌 Uso de Cores Intensificadas – O jornal passou a publicar todas as suas imagens em cores vibrantes, algo que antes era raro na imprensa esportiva impressa. Isso se assemelha à riqueza visual da TV, que sempre apostou em imagens de alto contraste para prender a atenção do espectador.

📌 Enquadramentos Dramáticos – Se antes as fotos eram registradas de maneira mais estática, agora passaram a focar nos detalhes da expressão dos jogadores. Suor escorrendo no rosto, a tensão nos músculos antes de um chute, a fúria de uma disputa de bola: elementos que reforçam a dramaticidade da cena.

📌 Formato de Quadro Cheio – Diferente das imagens tradicionais em jornais, que muitas vezes seguiam um padrão horizontal ou vertical, o Lance! adotou fotos em formato quadrado, remetendo diretamente à tela da televisão.

📌 Sequências de Imagens – Em vez de apenas uma foto por lance, o jornal começou a publicar montagens sequenciais, simulando os replays da TV. Isso trouxe dinamismo para o impresso e permitiu que o leitor reconstruísse mentalmente o movimento do jogo.

📌 Interação entre Foto e Texto – Muitas imagens passaram a ser recortadas, invadindo as colunas de texto ou interagindo com títulos e gráficos, criando uma diagramação mais fluida e moderna.

A fotografia esportiva, que antes era um registro puramente documental, passou a assumir um papel narrativo. Mais do que apenas mostrar um gol, ela precisava contar uma história. E essa foi a chave para sua reinvenção.


A Foto Supera a TV? A Magia do Instante Congelado

Ainda que a televisão tenha ditado novas regras para a fotografia esportiva, há algo que só a foto pode oferecer: o instante congelado.

Enquanto a TV exibe as jogadas em sequência, com múltiplos ângulos e replays, a fotografia captura o exato momento que define a partida. É o goleiro no ar, em uma defesa impossível; é a bola deformada pelo impacto de um chute poderoso; é a lágrima do atacante que perdeu um pênalti decisivo.

A imagem estática permite algo que a TV não pode proporcionar: o tempo de contemplação. O espectador pode analisar cada detalhe, revisitar aquela cena inúmeras vezes e sentir a emoção encapsulada em um único quadro.

O fotógrafo esportivo, portanto, não é apenas um documentarista. Ele é um caçador de momentos, alguém que precisa antecipar o que vai acontecer para estar no lugar certo, na hora certa, com a lente correta. Como revela o estudo, muitas vezes um lance incrível acontece em frações de segundo, e nem mesmo os profissionais mais experientes conseguem capturá-lo. Quando um jogador arrisca uma bicicleta improvável, por exemplo, nem sempre há tempo hábil para enquadrar e disparar a câmera. O que significa que, além de técnica, o fotojornalismo esportivo também exige instinto e sorte.


O Futuro do Fotojornalismo Esportivo: O Jogo Continua

O que começou como um esforço para se equiparar à televisão acabou tornando a fotografia esportiva ainda mais poderosa. Hoje, com o avanço das câmeras digitais e dos softwares de edição, a qualidade das imagens atingiu um nível impressionante.

Os fotojornalistas agora têm à disposição lentes cada vez mais potentes, permitindo capturas detalhadas de qualquer ponto do campo. E com o surgimento da fotografia digital, as fotos podem ser transmitidas e publicadas em tempo real, reduzindo a vantagem que a TV tinha sobre a velocidade da informação.

Mas será que, com tantas mudanças, a fotografia esportiva ainda precisa da televisão como referência? Ou será que, depois de tanto absorver do universo televisivo, ela já encontrou sua própria identidade?

O fato é que a relação entre fotojornalismo esportivo e TV continua evoluindo. O fotojornalismo já se provou essencial, e seu papel segue firme na cobertura esportiva. Porque, no final das contas, não importa quantas câmeras uma transmissão tenha: nada supera o impacto de uma grande fotografia que eterniza a paixão pelo esporte.

 


📌 Referência
CORDEIRO, Maria Fernanda; BONI, Paulo César. Fotojornalismo esportivo: a influência da televisão na imagem impressa. Discursos Fotográficos, Londrina, v.1, p.141-166, 2005.


REDAÇÃO LATITUDE

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